quarta-feira, 24 de junho de 2009

Casa pré-fabricada

Ou das estratégias de ascensão de Los Hermanos no campo musical da MPB

Existem dois elementos que conferem credibilidade e prestígio ao artista, enquanto sujeito do campo de produção musical. Valores importantes para se manter em evidência e administrar o direito ao poder simbólico: juventude e experiência. Embora conflitantes, com o passar do tempo, os cantores e compositores consagrados souberam manipular estes dois valores e encaixa-los de uma maneira engenhosa para gerar prestígio e status neste campo.

Segundo o Sociólogo Francês Pierre Bourdieu o poder simbólico é um artifício quase mágico que permite obter o equivalente daquilo que é obtido pela força (física ou econômica), graças ao efeito específico de mobilização. Ou seja, o poder simbólico no campo específico da música popular é bastante singular. A luta pelo monopólio`desde poder é capaz de revelar relações comuns ao poder físico e visível, como na política ou na economia, relações de liderança, intimidação e subserviência.


O modus operandi do campo musical está em grande parte ligado à busca pela juventude. Espera-se do artista sempre o novo. De maneira geral todos os agentes do campo musical caminham espontaneamente nesta direção, conceito que Bourdieu denomina habitus do campo; uma filosofia da consciência que não anula no agente sua verdade de operador prático da construção do objeto.

Este conceito vai contra à noção estruturalismo Levi-straussiano onde o agente é reduzido ao papel de suporte sem um papel ativo no campo. O habitus funciona como um código de disposições, condutas e protocolos tomados inconscientemente como legítimos que ordenam o comportamento desses agentes, organiza o campo e confere as regras da obtenção de capital simbólico.

Desta forma, para o habitus do campo de produção musical, repetir uma fórmula consagrada, manter-se estável num estilo, salvo algumas parcas exceções, coloca o artista/sujeito em descrédito; o fetichismo da juventude é uma forma de se ganhar poder no campo. Ao contrário da maioria dos campos de produção intelectual, onde a juventude muitas vezes confere, inexperiência e amadorismo, ser jovem na música pop, é um bem a ser conquistado para distinguir-se dos pares e ganhar evidência.

O poder jovem é irreverente, revolucionário, inquieto, criativo, são essas moedas importantes do mercado de bens simbólicos. Os músicos mais experientes neste campo e que perderam parte deste valor e conseqüentemente poder estão sempre em busca da fonte da juventude, deste frescor que se perdeu com o tempo. Associar-se a jovens músicos e compositores é uma forma de ganhar status no campo musical. Uma juventude emprestada, mas que confere representação e dinamismo ao velho artista.

Por outro lado, o jovem artista, carente de espaço e respeito do campo musical, tem como um atalho para se diferenciar essa mesma prática. Associar-se à imagem do consagrado é uma forma de adquirir rapidamente credibilidade e importância no campo. Um artista que consegue o prestígio de outro que possui em seu repertório de valores a experiência, a respeitabilidade ou o sucesso consegue evoluir mais rápido na cadeia de poder e prestígio junto aos seus pares, seu público e à crítica especializada. Confere visibilidade e gera força.


A relação juventude/experiência funciona como uma troca sinérgica de bens simbólicos que confere as duas partes ascensão e representação no meio. É essa luta da heterodoxia e da ortodoxia que movimenta o campo e confere poder simbólico.

A trajetória do grupo brasileiro Los Hermanos é um bom exemplo deste fenômeno. A banda carioca soube se aproveitar das oportunidades fazer trocas importantes e se posicionar de maneira marcante no mercado garantindo uma recepção amigável da crítica, aliados poderosos e um público fiel; conseguindo assim, uma rápida ascensão que os colocou em poucos anos no topo do campo de poder da música popular brasileira.

Na virada do século até sua precoce dissolução em 2008, o conjunto liderado por Marcelo Camelo, fez alianças, pagou tributos, refinou seu estilo, associou sua imagem ao samba melancólico de Chico Buarque e Dorival Caymmi, emulando uma forma de canção pop consagrada com requintes de originalidade e ousadia. Na sua escalada, a banda uniu forças com novas starlets como Maria Rita e velhos medalhões como Erasmo Carlos. Ao fim da metamorfose, Los Hermanos transmutou de uma despretensiosa banda de hardcore para um elemento importante e poderoso no campo da MPB, a ponto de redefinir os caminhos que serão trilhados pelo grupo que é chamado por alguns autores de Nova MPB no século XXI.

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